quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Apontamentos para quem ama ensinar História do Brasil

História, metodologia, planos de aula, escravidão, livro didático de História, esquema


Escravidão no Brasil – 1500 a 1888





  1. Interpretações sobre o período: concepção materialista introduzida no Brasil de forma pioneira por Caio Prado Júnior em 1933.
  2. O escravismo (grande plantação, monocultura exportadora, mão de obra escrava) seria um modo de produção novo? JACOB GORENDER
  3. Um modo de produção escravista colonial – CIRO FLAMARION CARDOSO
  4. Patriarcalismo – A Casa grande é mais importante que a Senzla - GILBERTO FREIRE, OLIVEIRA VIANA
  5. Explicação pelo latifúndio – ALBERTO PASSOS GUIMARÃES e LEÔNCIO BASBAUM
  6. Dualismo: no Brasil vigoravam dois sistemas – capitalismo e escravismo – J. NORMANO, IGNÁCIO REIS, LAMBERT
  7. Dualismo de Nelson Werneck Sodré – escravismo no litoral açucareiro e feudalismo no restante- NELSON WERNECK SODRÉ
  8. Capitalismo incompleto – FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
  9. Capitalismo moderno – A escravidão era meramente um capitalismo moderno – PAULA BEILGUELMAN



É importante que o professor de História exponha, sem pressa, aos alunos rápida biografia intelectual, dos grandes pensadores e teóricos destes pontos de vista. Situar cada um nas lutas de seu tempo e o significado para o momento contemporâneo.

Nelson Werneck Sodré, Alberto Passos Guimarães, Leôncio Basbaum, são intelectuais atuantes no período de intenso debate político e cultural brasileiro antes da Ditadura, no período 1954-1964. Nelson Werneck Sodré (1911-1999) foi professor do ISEB.


Fontes:

José Oscar Beozzo. Encontros com a civilização brasileira, nº 1 – Rio: Editora Civilização Brasileira.

domingo, 25 de dezembro de 2011

NELSON WERNECK SODRÉ - por Carlos Heitor Cony

CARLOS HEITOR CONY

Nelson Werneck Sodré


RIO DE JANEIRO - Entre os centenários que, neste ano, estão sendo comemorados, destaco o de um dos homens que mais me impressionaram pela sua cultura e dignidade.
Não o conhecia pessoalmente, mas lia os seus livros com prazer e proveito. Logo no início da quartelada de 1964, estava preso numa das fortalezas da Guanabara, fora dos primeiros a ser punido pelos seus colegas de farda, pois se tratava de um general cujo pensamento desagradava aos homens que haviam tomado o poder.
Todos os que o conheceram tinham a certeza de que era um dos homens mais íntegros de nossa paisagem intelectual. Podiam discordar dele, mas sabiam que Nelson Werneck Sodré (1911-99) colocava, acima de tudo, a dignidade do ser humano, a sua e a dos outros. Sua obra abrange três segmentos interativos pela sua cultura de fundo humanístico: a literatura, a sociologia e a história. Foi mestre nos três departamentos.
Tornou-se citação obrigatória de todos os pesquisadores que estudam o processo brasileiro como um todo, e não em seus departamentos estanques.
Um texto de Nelson Werneck Sodré sobre Machado de Assis ou sobre um dos nossos ciclos econômicos se destaca pela abrangência de sua visão. Conhecia o geral e chegava ao particular. Sabia ver a árvore e a floresta.
Um dos líderes mais respeitados da nossa intelectualidade, nunca se deixou fascinar pela badalação inconsequente de certa época, nem pelo radicalismo carreirista que marcou a carreira de tantos. Nunca deixou de ser um ponto de referência do pensamento brasileiro. Teórico do nacionalismo, jamais se tornou xenófobo.
Recusou cargos, compensações e homenagens. Viveu austeramente. Formava o escalão mais consciente da esquerda que ele procurou ensinar, explicar e pela qual sacrificou sua vida.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz1905201105.htm

domingo, 18 de dezembro de 2011

Marxismo e partidos de esquerda em Ponta Grossa - 2011

Grupos de esquerda, em Ponta Grossa, se constituem em pequenos feudos, reduzido número de personalidades, em geral, com vinculação acadêmica, que reunidos discursam para si próprios. Suas explanações são tímidas, pois os demais companheiros já conhecem o falatório.

São semelhantes aos partidos do latifúndio e da burguesia onde o povo não participa nem é tema. Eles não o procuram. Contentes com o papel de grupelho de apoio que hes permite visibilidade, correrão atrás de políticos expressivos em busca de alguma assessoria parlamentar. Se a direita ignora em seus encontros as necessidade básicas, políticas sociais públicas, para os ponta-grossenses, porque o povo manipulado votará nela, a esquerda nem considera importante conhecer tais problemas. Conhece o estádio do Operário, as praias paranaenses, mas não os bairros abandonados, as residências em risco nas barrocas, o caos na saúde pública do município, nem consegue ler tais questões à luz do marxismo. No máximo, são análises acadêmicas. Anos passados me apresentaram em casa, um jovem empresário, político e militante do PT. Pretendia me visitar outras vezes, conversar sobre política. Quase duas horas de conversa, onde expús o que pensamento do conteúdo e do caráter da ideologia. Nunca mais retornou e o vi de relâmpago, poucas vezes, nas ruas de Ponta Grossa. Se decepcionara com a conversa, certamente. Posteriormente soube que, não apenas se frustrara comigo, quanto me considerava, absolutamente, irrelevante para a interpretação da política. Alegava, do alto de sua falta de estudos e oportunismo, uma limitação em meu pensamento, algo que não correspondia ao cotidiano da Câmara de Vereadores. Por que? Ele, tão petista, lá fazia concessões, tocava a música dos que, ao pedir votos, criticava. De repente a figura entrou num dos pseudo-partidos políticos de Ponta Grossa, dessas igrejinhas fundadas para veneração de personalidades incultas do planeta. O tal partido, praticante do culto a personalidade, ganhou uma boquinha no governo neoliberal do município e lá, o ex-petista, ganhou chefia comissionada para não trabalhar. Era isso que desejava e não o socialismo, a justiça, o bem do próximo. Claro, meus conceitos não lhe serviam, porque afirmo ainda, como dizia meu bisavô, homem tem que ter coerência e honrar o fio de bigode. Além do que, o socialismo deve começar comigo, em mim. Esses tais são socialistas até que está posição não os impeça de usufruir da oportunidade de cargos, mesmo que para enrolar e dispender dinheiro público que faria bem em problemas reais da população. Se essa oportunidade não se vislumbra, nem vende a alma para o diabo, apenas lhe devolve. Não dignifico tais pessoas, não acredito e jamais recomendo votos nelas sob quaisquer pretextos, nem mesmo o de amizade. Me referi acima à espécie do travesti na política. Mas há outro, o socialista pseudo-pragmático puro.

Alguns elementos das forças, que se pretendem de esquerda em Ponta Grossa, cujos referenciais teóricos, também, seriam meus, andam distribuindo a tabuletas e crachás de pureza ideológica e partidária. A categoria “teórico” está, consagradamente, atribuida à minha fala e escrita. Isso soa estranho, porque são eles que não falam sobre os problemas concretos da sociedade, realidade social, projetos de desenvolvimento econômico, acesso a níveis superiores de riqueza, dor, miséria, sofrimento, o penar da maioria. Não entendem. Tem sido incapazes de escrever três linhas, respaldados no marxismo, que se orgulham defender. Creio que, de sexo, talvez entendam e ainda assim não coloco mãos no fogo. Quem procurar nos jornais artigos de comunistas, petistas, socialistas variados, sobre os problemas sociais de Ponta Grossa não encontrará. Eu escrevo e sou classificado como de segunda categoria. Apresentando e desconsiderando meus escritos por ser “de um teórico apenas”. Não fosse a malandragem, o espírito pejorativo, consideraria elogio, pois ao menos, consigo formular proposta de pensamento respaldada em intérpretes de alto coturno da realidade brasileira. Todos sabem que nutro simpatias pelo pensamento isebiano, que considero atualíssimo, não datado e em especial pelo historiador Nelson Werneck Sodré. E nisto, pasmem! não estou sózinho, apesar do desprezo da esquerda. Fundou-se no Brasil, o Partido da Pátria Livre, cujas idéias devem ser consideradas e conquistam adeptos, pautado no nacionalismo econômico e desenvolvimentista.

Sempre recusei reuniões bobas e alientantes, aulas fantasmagóricas de marxismo, tal a pobreza ou inexistência de aplicação do materialismo histórico a realidade tão cruel quanto a paranaense, a pontagrossense, em particular. Cansei das poses, dos figurinos, do esquerdismo. Marxismo, socialismo, justiça social, materialismo histórico não são tranpolins para carguismo e personalismos. São questões de caráter, solidariedade, militância sem fins financeiros, pelo bem do Brasil e de sociedades locais em particular, e não ficarão restritos às igrejinhas intelectuais exibicionistas.

A pecha de teórico não me pertence. O socialismo, o espírito revolucionário, herdei desde os meus bisavós. Vim da roça, onde se praticava ainda o sistema de meeiro de plantação e onde crianças trabalhavam sem proteção trabalhista. Minha família foi vítima do latifúndio, cuja essência é a violência, ganância e desrespeito à terra. Dali, a realidade me levou ao socialismo e ao marxismo. Neles estou aferrado e não sucumbi, mesmo tendo vivenciado a desestruturação da saudosa União Soviética, que lamento. Ando a pé, de ônibus, pelos vários bairros de Ponta Grossa, cada cidadão que encontro, longe do conforto que usufluo como funcionário público, cada pessoa catando, não apenas, lixo mas, tirando dele seu sustento alimentar, me comove e entristece. Jovens envelhecidos pelo sol ardente, mães solteiras, o triunfo das drogas sobre a juventude, a falta de acesso a saúde com qualidade e dignidade e tiro daí minha reflexão. Coloco isso nos meus comentários. Teóricos são esses idiotas.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

NELSON WERNECK SODRÉ: crise na URSS e cisão do PCB

Rio, 01.08.92

Prezado Acir da Cruz Camargo, saúde e paz.

Recebi e estou respondendo a sua carta de 28 de julho p. findo. Quero, preliminarmente, lhe agradecer os termos que tão generosamente se refere ao que tenho feito. As recompensas do trabalho intelectual são poucas, na verdade. Mas, entre elas, está, com enorme importância, a de proporcionar ao autor angariar amigos que ele não conhece, que são seus amigos tão somente porque apreciaram as suas obras. É extremamente reconfortante, quando isso acontece.

Passo a responder as suas duas perguntas. Sobre o analfabetismo, e a maneira de combatê-lo: como é sabido, o analfabetismo declina na medida em que o desenvolvimento material avança; assim em sociedades capitalistas avançadas (Alemanha, Estados Unidos e outras) o analfabetismo tende a desaparecer. O nosso, o brasileiro, está intimamente ligado e dependente do atraso do país. Na medida em que avançamos, progredimos, mesmo no nível meramente material, ele tende a declinar e está declinando. Pode, pois ser erradicado, sem nenhuma dúvida. As áreas socialistas praticamente acabaram com ele. Mesmo em Cuba, com seu passado colonial, teve êxito nesse propósito e não foi isto dos menores méritos do regime ali instaurado. Claro que a alfabetização e a cidadania são sempre conjugadas.

A segunda pergunta merece resposta mais circunstanciada. Claro está que a crise na União Soviética (que foi uma crise da União Soviética e não uma crise do socialismo) acarretou consequências em todo o mundo. No Brasil, acentuando uma linha que já dera alguns sinais antes, provocou o aparecimento de uma ala, no próprio PC, que marchou para uma revisão do partido e de tudo o mais que dizia respeito a sua atuação. Essa tendência, que já existia e progredia, aproveitou a crise para realizar, em dois congressos com pequeno intervalo entre um e outro, alterações que motivaram a cisão. Pessoalmente, tenho amigos nas duas alas e fiz o possível para que não chegasse a tal cisão. Tenho muitas dúvidas sobre se a abolição do símbolo histórico da foice e do martelo e a mudança do nome do partido significam mais do que problemas superficiais. Havia necessidade de mudar, realmente, algumas formas de proceder. Mas não havia que mudar, no meu modo de ver, o essencial da conduta partidária. Estou certo de que as duas alas estarão juntas, face aos problemas essenciais que se apresentarão no cenário político brasileiro. Como estou certo de que a crise na União Soviética está longe de ter chegado ao fim: é uma novela em seus primeiros episódios. Posso lhe assegurar, de mim, que estou, mais do que nunca, aferrado ao socialismo e ao marxismo, fora dos quais não vejo saída para a sociedade humana e para a brasileira em particular.

Creia na estima e apreço do

Nelson Werneck Sodré

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

NELSON WERNECK SODRÉ: história nova e materialismo histórico no Brasil

Rio, 18.01.93
Prezado Acir da Cruz Camargo, saúde e paz. Respondo sua carta de 08 de janeiro corrente, ponto por ponto. Agradeço as correções ao meu livro A ofensiva reacionária. Nunca sou eu quem corrige os originais ou as provas e padeço, como todo autor, do problema das incorreções no texto. É preciso ter paciência. Suas correções serão introduzidas em uma nova reedição possível. Vou lhe enviar uma obra minha que tem a relação de todos os meus livros. Não tenho cópia do artigo sobre Álvaro Vieira Pinto e o jornal Diário de Notícias desapareceu. Osvaldo Costa, um dos maiores jornalistas brasileiros, já falecido, foi o diretor e editor de O Semanário. Genese e formação da consciência nacional é o mesmo Consciência e realidade nacional, obra de Álvaro Vieira Pinto. Alceu Amoroso Lima não se recusou a falar no ISEB; trata-se de uma mentira divulgada na época. O livro publicado em Moscou tem título em russo, língua que desconheço. Não foi posto à venda no Brasil, nem foi traduzido. Pedro Celso Uchoa é, atualmente, professor na Universidade de St. Louis, nos Estados Unidos, Missouri. Foto minha só tenho antiga. Vou ver se encontro. Eu não disse que os textos do ISEB não se baseavam no materialismo histórico. Disse que os textos da História Nova é que nele não se baseavam. E disse certo, pois tais textos, embora revelem nos autores conhecimento do materialismo histórico, foram propositadamente, redigidos de maneira livre, isenta de fidelidade ao materialismo histórico, uma vez que seriam editados, como foram, pelo MEC e isso nos impossibilitava de obedecer, ortodoxamente, ao materialismo histórico. Tais textos eram alternativos, para os professores, que, sem eles, só dispunham dos compêndios de clara indigência terrível. Fazendo um trabalho para o Estado, não podíamos aplicar, a rigor, um método que o Estado não apreciava. A mente dos autores, pelo menos naquele tempo (alguns mudaram de posição) era norteada pelo materialismo histórico. Considero Formação histórica do Brasil o meu livro fundamental. Não sei se é o melhor, mas é o que assinala um rumo que seria o meu pelo resto da vida. Por último, não conheço nenhum estudo especial, em livro, sobre a minha obra. Quanto à entrevista, é preciso apenas combinar dia e hora. Pois sempre viajo. Agora mesmo estou de partida para S. Paulo, onde devo permanecer um mês. Abraços do amigo Nelson Werneck Sodré

NELSON WERNECK SODRÉ: História nova, história e marxismo no século XX


Rio, 05.05.94

Prezado Acir da Cruz Camargo,

saúde e paz. Acuso recebimento de sua carta de 02 de maio corrente, que passo a responder. Em primeiro lugar, meus agradecimentos pela sua lembrança do meu aniversário. Na verdade, velhos não comemoram aniversários, mas é sempre bom ser lembrado pelos amigos. Claro que, no âmbito da crise geral e da crise da cultura brasileira em particular, a da Universidade é natural. Nela, por isso mesmo, a História está sendo abandonada ou posta em segundo plano. E o marxismo, em consequência, como é próprio da época.

Como você, fiquei decepcionado com o depoimento do Pedro Figueira, na edição que o editor Giordano fez da História Nova. Creio que é um problema de esclerose e nada mais. As correntes pretensamente inovadoras, no campo da História e de seu ensino, correspondem à crise da época em que vivemos e à ofensiva da reação em todos os campos. Isso passa. Não deve preocupar os que se entregam ao estudo da História enquanto ciência e ao materialismo histórico, que a colocou nos devidos termos. Quem me iniciou no estudo da História foi o meu professor dessa matéria, no Colégio Militar do Rio de Janeiro, em 1926. Ele se chamava Isnard Dantas Barreto e foi um grande professor. A História do Brasil é uma parte da História abrangendo o tempo histórico e todo o espaço. Ela é uma ciência, sem a menor dúvida, aliás, a ciência das ciências, pois a todas é possível estudar pelo método histórico. Quando tirar retrato não me esquecerei de lhe enviar uma cópia.

Abraços do

Nelson Werneck Sodré

PS. - As suas cartas não me importunam. Ao contrário.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

NELSON WERNECK SODRÉ: um general contra o neoliberalismo

Rio, 21.07.96

Prezado Acir, saúde e paz.

Respondo sua carta de 12 do corrente.

A correspondência com os amigos não representa peso para mim. Apesar dos 85 anos completados, continuo em atividade, agora, no combate à última praga que nos chega, o neoliberalismo.

A relação entre o ISEB e Paulo Freire, como a minha relação com o trabalho dele existiu de fato. Não participo da posição de Vanilda Paiva em relação a ele, apesar da consideração que tenho por ela.

Não espanta a sua dificuldade em encontrar as minhas obras. Elas estão esgotadas, na maior parte e o mercado editorial sofre a crise imposta pelo neoliberalismo. Com um pouco de paciência, creio que voce conseguirá completar a sua coleção.

Cláudio Giordano, editor benemérito e audacioso, gostaria de reeditar a História Nova mas as dificuldades são insuperáveis. A opinião do professor, que voce resume, é uma opinião: nada tem a ver com o que escrevi.

O plano econômico de FHC é uma enfermidade universal; e a Revolução brasileira vai avançar, apesar dele. Há uma ala da burguesia que, ligada ao mercado interno principalmente tem interesses no nacionalismo. E por isso vem sendo esmagada.

Abraços,

Nelson.

Nelson Werneck Sodré - o que é História

Rio - 27.09.93

Prezado Acir da Cruz Camargo,

saúde e paz. Respondo sua carta de 16 do corrente. Fico muito satisfeito em saber de sua pesquisa sobre a minha obra. Grato por isso. A leitura dos autores que fizeram críticas à minha obra e ao ISEB é também merecedora de estima. Já tive a oportunidade de escrever que são os nossos adversários, adversários das nossas idéias, que fornecem o nosso verdadeiro perfil, justamente porque destacam o que não somos, o que é tão importante quanto o que somos. Respondo por isso com prazer ao questionário que acompanha a sua carta, ponto por ponto. Antes que me esqueça: o livro sobre populismo já foi encontrado e remete-lo-ei na próxima semana. Estou dependendo apens da pessoa que ficou de me trazer em casa exemplares desse livro. E vamos ao questionário.

1. O fato de autores da USP (só conheço um, aliás) me acusarem de seguir uma linha esquemática e estalinista não tem, para mim, a menor significação. Corresponde, apenas, a uma posição negativa que faz parte da luta ideológica. Nós, no ISEB, não postergávamos a luta de classes, absolutamente. O ISEB tinha vários professores e, conquanto, depois de grave crise, preponderasse ali uma linha marxista e nacionalista, a verdade é que ela comportava variantes. Alguns críticos, anti-isebianos por vários motivos, estavam mais à esquerda do que os isebianos, acusavam-nos, a nós do ISEB, de não sermos suficientemente esquerdistas. Acontece que eles, os críticos, não eram marxistas. Não fomos, pois, revisionistas, muito ao contrário. Voce pergunta: "Por que um marxista, num dado momento, deixa de pensar a luta de classes e sim uma aliança de classes". Ora, isso não deriva de desejos; deriva da realidade. Corresponde à necessidade de estabelecer aliança com uma classe para derrotar a outra, aquela que, na fase é, é a principal inimiga. Isso acontece com frequência na História e não depende apenas da vontade das pessoas.

2. Como conciliávamos, no ISEB, eu e os companheiros, a questão da luta de classes com a aliança com a burguesia nacional, naquela fase para enfrentar o imperialismo? O inimigo principal era o imperialismo. Os nossos críticos desejavam que, por fidelidade a um princípio teórico, abandonássemos a luta ou nos isolássemos. Havia, na burguesia nacional, contradições com o imperialismo. Isso nos aproximava dela; ou, antes, ela se aproximava de nós. Não me recordo das colocações do companheiro que escreveu Consciência e realidade nacional, livro importante que precisa ser lido com senso crítico. Claro está que jamais entendemos a aliança como esquecimento de que há uma exploração do trabalho, luta de classes. A aliança da fase não importava em ignorar isso ou negar.

3. Temos, realmente, a mais retrógrada burguesia, na História. Isso, entretanto, não importa em negar, na sua parcela nacional, contradições com o imperialismo, que é um dado da realidade. Enquanto ela aceita tais contradições, tem condições de lutar com o trabalhador, não para estabelecer o socialismo, mas para enfrentar, transitoriamente, um inimigo comum.

4. Sempre pensei que as teorias que defendi, na teoria e na prática, eram, e são aplicáveis a todos os povos latino explorados do mundo, particularmente aos latino-americanos.

5. O Fascismo cotidiano é um livro, editado em São Paulo, em 1990, pela editora Oficina de Livros (Av. Brigadeiro Luiz Antonio, 469, s. 83, cep 01317-001, São Paulo).

6. Não tenho notícias de recentes comentários, resenhas ou críticas ao meu livro Formação histórica do brasil. Isto faz parte da política de abafar pelo silêncio, usual entre nós, na luta ideológica.

7. Não tive formação universitária em História. Sou, nela, um autodidata. No meu tempo, não existiam estudos universitários de História. Não havia faculdades de Filosofia, nem mesmo Universidades, nem Institutos de Letras. E a vida militar, depois, me impediu que, mesmo adulto ou velho, me matriculasse nas que apareceram. Os de formação acadêmica me criticam e alegam essa ausência de diploma para me negar. Na verdade, o ensino de História, nas Universidades, está muito distante daquilo que eu aceito como História. É uma forma de alienação. Já dei cursos em diversas Universidades, cursos avultos. Nunca exerci a cátedra universitária, nem desejo exercê-la.

É o que me acode para responder aos quesitos propostos. Fico ao seu dispor para mais. Um abraço ao Pedro, Outro em voce do

Nelson Werneck Sodré

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Nelson Werneck Sodré critica o ensino de História em Ponta Grossa

Rio, 22.03.93

Prezado Acir da Cruz Camargo, saúde e paz.

Ausente do Rio por mais de mês, encontrei, de volta, a sua carta de 04 do corrente. Esta a razão da demora em respondê-la. Vamos, ponto por ponto.

Ainda não lhe enviei a relação dos meus livros publicados porque ela consta de um deles e precisa ser atualisada. Logo a terá em mãos.

Quanto às afirmações do professor a que se refere, refletem a sua mentalidade. Afirmar que a tese do feudalismo no Brasil foi por mim esposada por imposição do PCB não é apenas uma inverdade, é uma calúnia, costumeira na boca de pessoas do quilate desse que "ensina" História em Ponta Grossa. Também é clamorosa inverdade a afirmação de que me retratei da idéia da existência de feudalismo no Brasil. É outra mentira vulgar, agora deslavada porque ultrapassa o nível da simples opinião para mencionar um fato inexistente. Agora a sua pergunta: nao revi a afirmação de que o movimento de 1930 foi parte da revolução burguesa no Brasil. Ela está de pé em meu trabalho Capitalismo e revolução burguesa no Brasil, editado pela Oficina de Livros, S. Paulo.

Um abraço do amigo,

Nelson Werneck Sodré

quinta-feira, 16 de junho de 2011

História política de Ponta Grossa - para um cientista social - 2ª parte

Relações entre jornalistas e mundo político

Nelson Werneck Sodré afirma que tudo é política. Só a ingenuidade sustentaria a inexistência de cumplicidade ideológica entre jornais, política e políticos. Isso se funda nas relações de poder e no processo histórico. Há, evidente, o egocentrismo de uns, medos de todos, ideologia e razões econômicas, fatores que determinam a o modo de produção da notícia e do diversionismo midiático.
Em Ponta Grossa, mundo político e jornais impressos, sempre estiveram afinados num mesmo discurso e sustentando esse único projeto social da classe historicamente dominante. Valendo da falta de acesso da maioria do povo aos bens educacionais e da cultura, a confusão conceitual acentuada em uma população desescolarizada como a nossa, destituída de condições psicológicas para proceder com pensamento crítico, de vez em quando sinalizam alguma divergência menor, algum contraponto, capaz de manter ares de moralismo. O que a população não alcança nem tem condições de encontrar é onde está a essência da suposta falta de sintonia. No campo das idéias políticas, é criminosa a tentativa de se estabelecer falsas diferenças entre os projetos político-sociais de Jocelito Canto, Péricles de Mello ou Plauto Miró Guimarães. A imprensa, porque numa sociedade de classes,  toma a posição que lhe corresponde às conveniências, deu a  impressão de que tais diferenças haviam e eram acentuadas. Editores-Chefes e proprietários tem notório comprometimento, e só a leitura atenta e demorada do interior dos periódicos o demonstrará, comm as fantasias e moralidades falsas da burguesia e dos senhores de terra, que lhes propiciam investimento em publicidade. Uma dificuldade dos jornais nos países sob o signo do capitalismo. O tratamento com Jocelito, candidato a prefeito, oscilou entre o moralismo da região, do tipo, forasteiro aqui não tem vez e direito e o carisma que o rádio e naturalidade com que se comunica com a população abandonada pela classe dominante lhe diplomam.
A contribuição dos Psicólogos na interpretação dos personagens no palco da política está por ser feita. São doutores em egocentismo, verdadeira patologia. Necessitam de veneração, endeusamento e tratamento mitológico. A imprensa escrita e televisiva lhes proporciona essa terapia danosa ao povo. Serão vistos sempre nas colunas sociais, comentados em matérias sensacionalistas, sobre seus pronunciamentos dignos de destaque. No frigir dos ovos, coisa para inglês ver, eles e o que dizem, ond estão importância social alguma tem. E sabem todos disto. Os jornais prestam-lhes este favor, e não totalmente de graça, empresários da comunicação e equipe sempre que necessário, político mal comportado com a linha editorial, recebe claro sinal de demonstração de força. Ao político cabe a boa missão de ler corretamente a cartilha do liberalismo econômico e filosófico, bom mocismo, rigorosamente inserido na linha ideológica do jornal. Os políticos não querem conpuscar essa imagem. O jornal, com certeza, tem boa tiragem e será lido pela classe média, pelos estudantes, servirá de base para os noticiários capengas do rádio e da televisão. O jornal se fundamenta numa ideologia não popular, sua base teórica é frágil, mas tem e pode ter uma coisa que o político não possue, opinião.
Então o político estabelece relações de boa vizinhança com as empresas jornalísticas, que despejam diariamente longas admoestações que beiram a religião, à classe política.
Se não há uma cumplicidade aberta e pessoal, há atrelamento teórico entre ambos, jornal, sistemático e objetivo em seu discurso sempre mais que o próprio politico da ideologia.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

História política de Ponta Grossa - para um cientista social

Em 1992 Ponta Grossa teve quatro candidatos disputando a Prefeitura. Nesse cenário político, representaram as forças tradicionais, conservadoras, defensoras dos senhores de terra e do empresariado, Adail Inglês, Djalma de Almeida Cesar e Paulo Cunha Nascimento. Não se deve estabelecer diferenças ideológicas entre eles, representavam mínimas e insignificantes fracções da camada social dominante. A candidatura de oposição a esse projeto continuista, reprodutivista, autêntica, estava encarnada na pessoa e na participação do Padre Roque e do líder comunitário, Giba. A questão maior, o problema posto, era de que o estabelecimento dessa candidatura esbarrava na forte estrutura financeira, no domínio cultural, no forte e resistente arsenal midiático que dispunham as forças do atraso e não apenas nisso. Havia sintomática resistência dentro do próprio Partido dos Trabalhadores, que capitaneava o conjunto das forças progressistas. Um grupo simpático a Péricles de Mello não emprestava apoio e empenho à divulgação. Questiúnculas de pequenez moral, mas que fortaleciam a situação, além da ciumeira interna e medo externo, que sempre seguiu a nossa história, a participação do povo no poder.
A luta ideológica era notável e acirrada. A nível nacional entráramos, a pouco tempo, na fase adentráramos ao universo conhecido como neoliberalismo. Jornais e emissoras de rádio e televisão saudavam a era Collor, o fim do socialismo e das forças trabalhistas no mundo inteiro. Substituindo Fernando Collor de Mello, Itamar Franco chegou a surpreender a nação, adotando políticas nacionalistas em alguns aspectos. A reação procurou motivo para a ridicularização e crítica apoiando-se em seu estilo físico. O nosso entusiasmo seguiu no governo de Fernando Henrique Cardoso.
Em Ponta Grossa os debates políticos foram acirrados. Parcela da juventude encampou, orientada pela liderança do DCE, o movimento para a derrubada de Collor de Mello. A universidade, até então imóvel e aprisionado no conservadorismo, dominada pela geração antiga e simpática ao regime ditatorial, pelas forças das circunstâncias, se tornara o centro capitaneador dos debates e em seus cursos se incluiam esses problemas e temas pautados pela luta política e social,  como parte dos projetos de pesquisa a extensão. Os cursos retomava, com vigor, a discussão do pensamento de Paulo Freire e do ISEB, de Nelson Werneck Sodré e Álvaro Vieira Pinto, Vigotsky, Dermeval Saviani, Moacir Gadotti e Vanilda Paiva. Paulo Freire tinha a preponderância. Jornalismo, História, Pedagogia e Serviço Social se engajaram, foram às vilas longínquas do centro, levar projetos de alfabetização e cidadania à luz do método Paulo Freire. Fica no registro o movimento de alfabetização Reconstruindo o mundo, coordenado por Carmencita de Holleben Mello Ditzel, Jefferson Mainardes, Roque Zimmerman, Jussara Ayres Bourguinon, Zenilda Batista Bruginski e Vanessa Sabóia Zapia, alguns de relâmpaga participação. Até um projeto com meninos de rua foi desenvolvido, tendo a participação de Marilda Wosnika, não dos menores papéis. Este último funcionava nas dependências da Universidade e representava o idealismo de Carmencita. O marxismo alcançava estatus nas concepções filosóficas de diversas graduações e isso incomodava os professores reacionários e a imprensa, sempre conservadora.
Esse ano (1992) foi o mais rico em debate políticos e sociais. Nos parecia que a cultura ressurgira nos Campos Gerais. Em suas reuniões, o PT, cheio da presença de populares, líderes de bairros, dedicava espaços longos à discussão sobre o socialismo, das posições diferenciadas das tendências em relação ao tema. O PT também reunia pessoas inclinadas a outros partidos de esquerda. Os debates foram para o interior da universidade e nela receberam uma roupagem militante e acadêmica. Formava-se liderança pública. Isso não agradaria o espírito da época.
Em 1996 Jocelito, apoiado por fração das camadas dominantes venceria as eleições. A ofensiva reacionária que não alcançava o coração de uma população sofrida, sem remédios, sem moradia, sem recursos. Esgotaram-se os representantes dessas camadas tradicionais portavam um discurso moralista, distante do povo e pedante. Não foi difícil que povo caísse no colo de Jocelito, cuja ideologia e programa de governo, em nada diferenciava-se da classe dominante, tão somente obrigava o braço habilmente, caridoso com a parcela da população pobre, sem oferecer proposta de cidadania que lhe oportunizasse conscientização e crítica.
Jocelito chamou para si o preconceito e o ódio da classe dominante que levou junto de si todo o puritanismo da esquerda pontagrossense. A luta pessoal contra Jocelito colocou a perder um rico momento de debate de ideias e propostas progressistas.

terça-feira, 14 de junho de 2011

História da Licenciatura na UEPG - 1990-1994 - Nelson Werneck Sodré

Em 1992, Pedro Ferreira de Freitas e eu, acadêmicos, viajamos ao Rio de Janeiro, para participar de um congresso da UNE. Naquele ano e naquele momento, o presidente Fernando Collor de Mello sofria pesada artilharia das forças populares. No Rio de Janeiro, participamos de uma passeata, com milhares de pessoas e estudantes que tentavam impedir o recebimento de Collor pelo governador Leonel Brizola. Mesmo sob nossos protestos, o amadurecimento e paradígma Brizola, com quem deveríamos aprender muito, recebeu o presidente da República. O governador via com cautela toda aquela movimentação de estudantes e intelectuais contra o presidente e reportava isto como semelhante ao final do Governo Vargas. Hoje, creio que Brizola tinha razão em parte.
Estando hospedados na UFRJ, munidos de um mapa da cidade, Pedro e eu, depois que comprei um exemplar de "Formação histórica do Brasil", saimos à procura de Nelson Werneck Sodré, isto no dia em que retornaríamos ao Paraná. Achamos fácil. Foi uma grande surpresa tudo o que aconteceu.
Chegamos na Rua Dona Mariana e entre os prédios e arvoredos, encontramos o apartamento de Nelson Werneck Sodré. Apertamos a campainha e uma bondosa senhora nos atendeu pela janela. Era Dona Yolanda Frugoli Sodré, esposa do General. Nos apresentamos como estudantes, paranaenses, de História que aproveitando o congresso da UNE, tínhamos curiosidade em conhecer Nelson Werneck Sodré. "Nossa! podem subir, desculpem, o Rio é muito violento, por isso perguntei quem eram e o que queriam. Chegamos da missa e Nelson está saindo do banho". Eu, fundamentalista ideológico, jamais imaginaria o escritor marxista vindo da missa. Não quiz perguntar. Me assustei apenas. Sentamos e enquanto Dona Yolanda nos fazia as cortesias, descia da escada, um homem de paletó escuro, óculos densos, de baixa estatura e fomos apresentados. Fiquei um pouco inquieto e Pedro sentou-se, feliz e honrado, entre eu e Nelson Werneck Sodré, mas não tínha assunto. Eu resolvi pedir respaldo dele a minha ferina espada e intransigência em defender seus escritos e também me munir de respostas aos seus detratores. Perguntei-lhe o que achava do conceito de populismo. Eu me cansava de ouvir essa expressão nas aulas do curso de História. Ainda não abandonaram essa mania. Nelson Werneck Sodré me respondeu que esse era um termo muito usual em ciências sociais e deveria me acostumar a ele. Mas deu uma definição bem próxima do alcance dos novatos estudantes universitários, sem gravador e sem caderno para fazer anotações. Populismo é quando um governante procura atender revindicações que, seriam por natureza, dever do povo formulá-las. O populismo, disse, não é de todo mal.
Então, disse a ele que lera e ficara indignado com o livro ISEB: fábrica de ideologias, de Caio Navarro de Toledo. Werneck Sodré me respondeu que conhecia bem o livro e que se tratava de uma das mais abalizadas críticas que recebera. Era um livro respeitável e recomendável. Eu não entendia como um escritor que, no livro História e materialismo histórico no Brasil, detonava Caio Navarro, aqui se mostrava um homem dócil, humilde, acadêmico no sentido verdadeiro do conceito. Enguli aquela.
Falamos sobre o PCB, o surgimento do PPS. Nelson Werneck Sodré apostava que um dia essas facções se uniriam por um projeto de Brasil, que encampasse o interesse do povo brasileiro. Perguntei se o marxismo estava mais resguardado no PCdoB. "É o que eles dizem" me respondeu. O Pedro lhe perguntou sobre o futuro de Cuba e da China. Sodré nos respondeu que a China tomava um caminho sadio e inteligente de manutenção do socialismo. Cuba, não sabia até quando duraria.
Era um homem apaixonado pela juventude, gostava de ver nosso interesse pela sua obra, não era um homem de linguagem pedante. Depois daquela visita, troquei correspondência com ele até seu falecimento. As cartas que lhe enviei estão de posse e direito da Biblioteca Nacional do Brasil. Com o livro autografado, a promessa dele em me enviar o livro "O populismo", publicado por um deputado do PDT, saímos de sua casa para a rodoviária do Rio de Janeiro.
Nelson Werneck Sodré pautaria, de vez, minha interpretação da história do Brasil, até hoje.

História da Licenciatura na UEPG - Ivan Meneguzzo

O mestre Ivan Meneguzzo, brasileiro e professor

Em 24 de abril de 2009 falecia o Professor Ivan Meneguzzo. A História registrará a contribuição Meneguzzo como professor exemplar que pensou com seus alunos a cultura nacional, o amor ao povo brasileiro. Patriota ardoroso no combate às injustiças sociais pela via do trabalhismo. Um desenvolvimento brasileiro que proporcionasse aos excluídos, oportunidades de trabalho, dignidade e legislação protetora. A revolução brasileira de 1930 era seu tema predileto e o ministrava com a alma. Aqueles que se graduaram tendo sido seus alunos, receberam dele o exemplo das aulas bem ministradas, com conteúdo e sentido. Aquilo que falava e transmitia era útil e necessário ao aprimoramento intelectual e a cidadania. Suas exposições despertavam um amor indescritível pelo Brasil raramente encontrado na Universidade. Era dedicado, cumpridor de horários, educador exemplar. A marca de suas aulas era transformar temas e conceitos complexos e conteúdo inteligível, fugindo sempre do pedantismo comum dos modismos teóricos. Ivan Meneguzzo está na dissertação de Célia Regina de Souza e Silva. A coragem intelectual e a posição nacionalista firme lhe garantiram a vantagem de não compor guetos ideológicos e a independência no ensino. Não foi o mestre de somente longas bibliografias, mas de reflexão profunda, autêntica e original. O texto fotocopiado era objeto de longas discussões, detalhadas, ardorosas, voltadas à realidade brasileira. O esquerdismo, antinacionalismo acadêmico se tornaram adversos à prática do Mestre privando a cidade da sua contribuição sociológica. Imprimiu em EPB (Estudos de Problemas Brasileiros) uma face crítica, contextualizada e progressista, então resquício do regime militar. Sofreu calado, por educação, com o avanço da ofensiva reacionária nos conteúdos de História, teorética que nada diziam à população. O posmodernismo varria, para o desencanto das forças progressistas, os currículos de Ciências Humanas. Era educador modelar, ensinava de verdade. Diferenciou-se pela ausência de vaidades peculiares da academia, pelo brilho e rigor, da posição política justa e pública. Trabalhismo e marxismo eram coisas próprias do fim da História. Ocupar-se do legado de Vargas, João Goulart, Leonel Brizola fora do discriminador conceito de populismo não seria considerado científico nem próprio da universidade. Dominava com tranqüilidade temas da área econômica, teoria política, História e comunicacional, fazendo abalisadas análises da mídia em suas aulas, tendo mais tarde, atuado no radio esportivo. Navegava no marxismo com independência, crítica e sem aplicações vaidosas. Militava na revisão da História Brasileira, defendendo a busca de fontes variadas e ao lugar da história dos vencidos, mas não consentiam com um desmonte irresponsável da História do Brasil. Era possuído de cautela com a encantanda desmitologização historiográfica que jogava as referências nacionais no lixo. Não lhe importava a ostentação ideológica, mas a conduta de um professor que ensinava e vivia a importância do seu país. Mesmo assim são contundentes exemplos dessas convicções, o nome de Sandino dado ao filho, homenageando o líder revolucionário nicaráguense. Nossas autoridades educacionais honrariam o zelo cidadão ao distinguirem uma próxima escola pública aberta com o nome de Ivan Meneguzzo.



sábado, 11 de junho de 2011

História da Licenciatura na UEPG - 1990-1994

 

O período de 1990 a 1993 foi singular na história política de Ponta Grossa (PR). É impressionante anotar a participação dos cursos universitários, especialmente dos acadêmicos, na intensa luta ideológica que se travou nestes anos. A UEPG jamais se furtou ao seu espírito conservador em política, não apenas assistindo passivamente os acontecimentos e as contradições sociais ao redor, mas sustentando o discurso autoritário e nada fazendo para romper com as amarras da alienação e falta de sintonia dos municípes com a realidade nacional. Universidade e cidadania andaram dissociadas. 
Nesta década alguns cursos se distinguiram por fazer e proporcionar outra leitura do processo político. Jornalismo, Pedagogia, História e Geografia distinguiram-se, participando efetivamente nos movimentos sociais, meios de comunicação e trazendo as discussões das ruas para a sala de aula. Mas nestes cursos ingressaram docentes antenados com a produção acadêmica e intelectual engajada, que se impunha na bibliografia dos cursos de posgraduação de suas áreas e que também obrigavam docentes reacionários a repassá-los aos alunos, futuros professores da instituição, como obrigação de oferecer-lhes dados completos daquilo que precisariam para a aventura da pesquisa, do pensamento social e político e do desenvolvimento profissional.
O curso de História nesse período, e foi efêmero o fenônemo, travou cauteloso namoro com o materialismo histórico, utilizando-o, sem tomá-lo como método próprio e pessoal, com reservas. Alguns desses professores procediam de concepções religiosas, mas se abriam ao espírito crítico e o método histórico era a novidade e a expressão dessa renovação no país. Isso resultou, não apenas em qualidade de participação, alguma luz no obscurantismo cultural que vinha assolara sempre a universidade, que se ambientava confortavelmente no ninho confeccionado pela ditatura militar, até porque, no corpo docente, residiam indivíduos vinculados aos órgãos de repressão do regime. O curso de História avançava em qualidade. Professores exigiram dos acadêmicos contato com abalisada bibliografia, historiografia renomada, autores europeus e latino americanos, obras de revisão teórica e de pesquisa profundas. O ensino de História que repetia de forma melhorada o conteúdo do ensino colegial, deixava o factual, anedótico, próprios dos manuais comportados da época, para debater, repensar e reinterpretar a História, inspirados e municiados em obras de referência produzidas nos grandes centros. Tiveram mérito nessas mudanças, professores da fase, Carmencita Holleben de Mello, Rosângela Wosiack Zulian, Ivan Meneguzzo, Jefferson Mainardes, Elisabete Alves Pinto, Maria Aparecida Cesar Gonçalves, Niltonci Batista Chaves, Aída Mansani Lavalle, Maysa Margraf, Teresa Jussara Luporini e Carlos Alberto Maio.  Ensinaram e formaram a geração de futuros professores nos conceitos importantes dos modos de produção, olhar mais acurado sobre a Idade Média, à luz das teorias econômicas. Alguns denominavam visão renovada de ensinar História. Nem bem nos alcançara, o materialismo histórico era temido por algumas pessoas, talvez por honestidade de não corresponder, na prática, no comportamento cotidiano, ao resultado dele. Carmencita, a mais representativa, rompeu com a modalidade aulas diretivas e autoritárias, incentivando a discussão entre as várias correntes historiográficas nas aulas de História da América. Embora os alunos jamais tenham escutado sobre Vicente Tapajós, era dele que ela procurava se distinguir. Aprendemos a procurar fontes clássicas, novos historiadores e aos economistas, para entender a história da América. Rosangela Wosiak Zulian, conhecida por exigir extensa bibliografia em História Medieval e Hístória Antiga legava a responsabilidade do profissional em respaldar em um arcabouço teórico responsável e de qualidade. Para estudantes que vieram de um ensino colegial em transição, suas aulas eram difíceis de compreender, dados os conceitos científicos utilizados. Mas propiciavam o desenvolvimento pessoal e intelectual singular dos alunos. O trabalho vigoroso e encantador destes professores, despertamos acadêmicos para tomarem consciência da transição que se operava no país, da qual  e fomos participantes, embora que alguns, só entenderam o que fizeram, passados anos depois. Além disso, nos mobilizaram por uma nova e fecunda forma de ensinar e despertar o amor dos alunos da escola básica pela matéria de História.
Outros professores, pouco mais distantes, mas que promoviam cursos de extensão, aperfeiçoamento, discutiam temas dessa renovação e assim, influiram na formação dos alunos de História, Leide Mara Schimidt, Mariná Holzmann, Ruth Holzmann e Priscila Larocca. 

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Liberação de armas - interesse de quem?

Insegurança e violência, não de agora, marcam o processo histórico brasileiro. Resultam da indiferença de classe e medo ideológico que povoa o pensamento das classes dominantes na América Latina. O darwinismo social implementado na política econômica é incapaz de responder às necessidades sociais. O crime e a violência interessam aos políticos e lhes amplia um tipo de comercio, além de justificar intervenção à fascismo na sociedade. Mídia e a política reacionária se nutrem do sensacionalismo com fatalidades. Tem a burguesia e os senhores de terras a intenção de incrementar o comércio de armas, iludindo-nos de que a liberalização do porte de arma propiciará a universalidade da aquisição e defesa, que segundo eles, o Estado não faz, não revelando que são seus legisladores que inibem o poder corretivo do Estado em crimes que realmente importam. É engano. Os pobres, vítimas da violência em todos os sentidos, continuará sem poder comprá-las nem registrá-las, pois seus argumentos não serão tão jurisdicados como da classe que os oprime desde a proclamação da República. Ao pressionar o Governo Popular e enfrentar a política de direitos humanos, criminalização dos movimentos sociais amplos, o semi-feudalismo e o capitalismo brasileiro busca facilitar a criação discreta de milícias senhoreais ou transformar as polícias estaduais e guardas municipais em braço armado contra quem atente contra a ideologia neoliberal, no Paraná com bandeira escancarada. Colocando essas questões ideológicas, no sentido que o Mestre da Economia Política as colocou no século XIX, deixarão de debater, discutir, implentar políticas conjugadas de educação, revolucionar a escola, transformando-a em espaço público que reune sociedade, família, indivíduo e autoridades de segurança num projeto que seja humanista, transparente, ético e sem corrupção para todas as partes.
(Jornal da Manhã, 20 de abril de 2011)

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Retrocesso educacional no Paraná de 2011

Filosofia da educação paranaense
O artigo do Professor Nilton César Bahls Gomes nos remete a duas questões fundamentais para compreender a crise instalada no Paraná com respeito à educação. A primeira delas, é a falta de exercício da cidadania por parte do professorado, que deveria ser o primeiro em ocupar as páginas dos jornais, as pautas da mídia, com reflexões sobre o cotidiano da escola. Estamos sob o signo de uma geração de professores que se recusa a falar, escrever, posicionar-se. Na maioria das vezes, se esconde atrás da luta de poucos, quando não, passivamente aceita a derrota. O problema levantado no comentário é antigo. Em segundo lugar, as esperanças do autor estão equivocadas, pois ele, estranhamente, entra no velho jogo do tal pai tal filho ou daqueles que acreditam que convicções são genéticas. O atual secrerário de Educação não tem vínculos históricos com a área, segue a décadas a orientação neoliberal e agora firmou subserviência a um projeto de sociedade onde a educação seguirá à deriva. Estamos diante do retorno do lernismo e por isso, desprendamo-nos de especulações proféticas, sabemos o final da música. O caos na educação é uma soma da carência de emprego, a esperteza burocrática dos governos e o mal caratismo profissional. Não se justifica que professores, aposentados, estejam tirando a oportunidade de trabalho de jovens educadores. Não é correto que pedagogos assumam disciplinas de Filosofia, Sociologia, História ou de outros conteúdos, substituindo e aniquilando a razão de existir de outras licenciaturas. Disciplinas ministradas por pessoas alheias ou sem notável conhecimento nelas empobrece a formação dos alunos e prejudica o respeito da sociedade por elas. Do outro lado, o professor precisa da decência em não fazer propaganda enganosa, não se permitindo lecionar aquilo que não lhe é próprio. Levando-se em conta a ofensiva reacionária quando os erros acontecidos no MEC é de causar espécie, o silêncio e a convivência das forças políticas da UDN diante do descalabro com o qual o novo governo neolernista principiou sua propaganda e prática filosófica da educação para o Paraná. Estamos, igualmente, deixando de falar no conteúdo da educação, como nos tornamos tecnicistas, desrepeitando todas as concepções progressistas que conhecemos na universidade, esquecendo-nos dos valores morais, sociais e éticos que deveriam integrar o conteúdo de todas as disciplinas. Ignoramos a importância da formação cidadã, autônoma do indivíduo, à luz do que aprendemos com Paulo Freire. Pagamos caro por uma educação meramente empreguista, cujo mote é apenas supostas melhorias salariais. Educar é um ato político. De quem? A partir de quando?